quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Ética e técnica em psicanálise

 










Luís Claudio Figueiredo / Nelson Coelho Junior / Marina Massi


O divã como morada da alma


Na apresentação do livro Ética e Técnica em Psicanálise, publicado pela editora Escuta, temos a impressão, ainda que em rápidas pinceladas, de estarmos no folheio de páginas promissoras no debate de dois temas, velhos conhecidos de guerra dos psicanalistas, que aqui arejados com inteligência, sensibilidade e elegância na escrita, brindam-nos com rumo diverso do tratamento dado a tais questões no âmbito da psicanálise.

Luís Claudio Figueiredo e Nelson Coelho Junior são autores, respectivamente, dos dois ensaios, “Presença, Implicação e Reserva” e “Fala, Escuta e Campo Terapêutico em Psicanálise”, organizados como ensaios mestres, acompanhados de alguns curtos ensaios no formato de apêndices.

Ao leitor não especialista, vale lembrar que Luís Claudio Mendonça Figueiredo é psicanalista, livre-docente da USP e professor do pós-graduação em Psicologia da PUC-SP, autor de livros de Psicologia: uma introdução (1991); Matrizes do pensamento psicológico (1991); A invenção do psicólogo: quatro séculos de subjetivação (1992; Escutar, recordar, dizer — encontros hiedeggerianos com a clínica psicanalítica (1994) e palavras cruzadas entre Freud e Ferenczi (1999). Nelson Coelho Junior é também psicanalista, doutor em Psicologia clínica pela PUC-SP e professor dos cursos de pós-graduação do Instituto de Psicologia da USP, autor dos livros A força da realidade na clínica freudiana (1995) e Merleau-Ponty: A filosofia como corpo e existência (1992). Para os psicanalistas esta apresentação fica aquém da efetiva contribuição que ambos têm no campo da Psicanálise local.

No parágrafo inaugural há os seguintes dizeres: “os ensaios aqui publicados resultam de muitas amizades. Em primeiro, a dos dois autores, amigos e colegas na PUC-SP, na USP e em dois grupos importantes de trabalho, O Grupo Clínico Terceira Margem e o de preparação dos Estados Gerais da Psicanálise, coordenado por Luís Carlos Menezes”. Não são apenas agradecimentos. Mas a confirmação da presença de colegas na discussão do pensamento psicanalítico por eles elaborado, é que está em questão. Parece pouco, mas não é — dar crédito ao outro. Abertura e respeito são traços contínuos no transcorrer dos textos. Sem dúvida, um bom começo para qualquer leitor neste país. Dito isto, vamos ao livro.

De início somos apresentados ao rol dos interlocutores que Luís Claudio e Nelson irão evocar: Thomas Ogden, Christopher Bollas, Sandor Ferenczi, Harold Searles, Maksud Kahn, Pierre Fédida e o casal Baranger. Na filosofia, referência está em Heidegger e Merleau-Ponty. O leitor já pode vislumbrar através das escolhas acima citadas, que a discussão será distante da arena institucionalizada da psicanálise, na qual o tema da técnica está, frequentemente, submetido.

Não é um livro de recomendações ou de regras prescritivas da prática psicanalítica; trata-se da compreensão dos procedimentos técnicos no plano da ética, ou seja, um espaço de liberdade, de pensar criticamente e com rigor o quê está subjacente aos procedimentos técnicos propostos por Freud e seus precedentes.

Ética, entendida pelos autores, “como posição e como lugar (morada), como postura fundamental, como modo de escutar e falar ao e do outro na sua alteridade — a alteridade do inconsciente. Uma ética compreendida como abertura, respeito, resposta e propiciação ao outro. Algo que não se assemelha em nada a uma "moral" e que, portanto, não poderá jamais ser convertido em um código de preposições e proibições.

Dentro da classificação de "teoria e técnica", produziram-se nas últimas décadas muitos artigos que abordaram o quê e como o analista "deveria" fazer num processo psicanalítico. Embora trate da técnica, a indagação norteadora dos ensaios está na constatação da presença de uma dimensão ética, intrinsecamente entrelaçada às diferentes proposições técnicas.

A noção de procedimento — de esfera técnica — não elimina a dimensão do outro e de sua alteridade singular. Os autores mostram que os procedimentos técnicos tem em si aspectos oriundos da prática e da experiência clínica de muitos analistas do passado e do presente, mas também nos revela o quanto as técnicas podem ocupar um lugar acomodado de saber, de eficácia ou de formatação do fazer analítico. Assim, eles reafirmam tratar-se, de fato, “muito mais de disposição ao convívio acolhedor, mas nem por isso tranquilo, com o inesperado e o irredutível que caracteriza a alteridade, do que da formulação de regras prescritivas que pudessem modelar o fazer analítico.”

O ponto mais intrigante do artigo do Luís Claudio: “Presença, Implicação e Reserva”, é quando ele sugere que possa ser vantajoso procurar as raízes melancólicas da posição do analista. E, passeando pelos desenvolvimentos de Heidegger da fenomenologia do tédio profundo, ou seja, uma espécie de “desligamento” que a radicalidade deste habita uma possibilidade de enfrentar o tempo e suas perdas como condição para uma outra forma de contato com a existência. Tem-se aí uma dialética de implicação e reserva, em que a reserva do tédio profundo remete à implicação do instante e da ação. Quando Fiqueiredo fala de uma parte entediada, está se referindo a uma possibilidade de deixar ser e que se aproxima do que o colega Ignacio Gerber chama de desapego, que seria, por sua vez, a condição de uma presença implicadíssima do analista — sem cometer a intrusividade no paciente.

Heidegger distingue níveis de tédio, a começar pelos mais banais e estéreis, sendo apenas no tédio profundo — que se abre uma perspectiva filosófica. Martin Heidegger (1929-1930). Les concepts fondamentaux.
Assim, diz Figueiredo, "manter-se em reserva, no caso do analista, é preservar uma parte entediada, desligada e indiferente, mas, por isso mesmo, disponível para o instante da decisão, para a intervenção vivaz, surpreendente e oportuna. Embora esta parte entediada e desapegada possa se assemelhar externamente à morte, é desta reserva que nos vem a capacidade de nos mantermos vivos e, principalmente, a disposição de ressuscitarmos a cada paciente, a cada análise, a casa sessão, a cada novo e inesperado elemento que uma sessão proporciona".

Um ponto em que estou em desacordo com os autores e que me parece deveria ser mais bem discutido, é a crítica feita aos psicanalistas ingleses, kleinianos, vistos às vezes de modo enrijecido, principalmente por Figueiredo, levando-o a retomar sutilmente as famosas controvérsias entre Anna Freud, Melanie Klein e seus seguidores.

Creio ser necessário contextualizar historicamente dentro dos desenvolvimentos da clínica da escola britânica, já que muitas mudanças ocorreram e, atualmente, certas críticas não possuem o mesmo terreno fértil das décadas anteriores. Sem dúvida, Figueiredo tem razão quando diz que a técnica kleiniana contrariou a exigência de reserva do analista, e até, ao contrário, revelou uma intrusividade excessiva do analista (excesso de implicação), através de interpretações profundas, que poderiam gerar mais autoritarismo e persecutoriedade do que acolhimento ao paciente. Embora esteja correto em sua indicação, temos que considerar que os ingleses trabalham muito os problemas técnicos nos últimos anos e que a preocupação com a dita intrusidade do analista foi bastante debatida, o que permitiu o surgimento de outros conceitos para responder a tais preocupações.

Dentro do desenvolvimento da clínica inglesa, temos Bion, por exemplo, trabalhando com a ideia de continência e de rêverie, e mais recentemente, o italiano António Ferro ou o californiano Robert Caper (“tendo uma mente própria”), isso para citar alguns autores entre muitos outros.

Nesse sentido, penso que há uma tentativa de justificar o advento dos conceitos de presença, implicações e reservas, como uma resposta ao excesso do kleinismo. Só que dentro do próprio desenvolvimento das ideias de Klein pelos seus seguidores, ocorreu a depuração de excessos, frutos de investigações de uma época. No meu entender e, até devido a minha proximidade com a psicanálise inglesa, considero mister registrar essa divergência.

Agora, o que tem de especial na ideia de Figueiredo de implicação e reserva? É justamente a ênfase no caráter não maníaco, antimaníaco, antimilitante da implicação de presença que é própria do analista. E isso é um problema absolutamente atual numa sociedade predominantemente da ação não implicada. Aqui reside, no meu ponto de vista, a ideia mais fecunda do artigo.

Voltando ao percurso do livro, temos Nelson Coelho nos provocando com a ideia de proposidade inaugural e de uma intercorporiedade, quando nos diz que em termos psicanalíticos, “podemos pensar a situação analítica e a produção de sentidos nesta situação, tomando-se por base um campo de profunda imbricação de experiências transferenciais e contratransferenciais, em meio aos encontros/desencontros transubjetivos, em que o corpo, com sua porosidade, aparece como elemento fundamental”.

O conceito de atenção flutuante é resgatado enquanto atenção igualmente flutuante, sendo entendido pelo autor como um “elemento central na constituição de uma ética da escuta e do falar ao outro em sua alteridade. Portanto, sendo neste lugar o encontro entre técnica e ética.

Nelson Coelho ressalta como no "difícil equilíbrio existente entre a escuta, o silêncio e a intervenção, situa-se o fio da navalha, a constante trilha oferecida ao analista a cada novo campo transferencial que se forma. A percepção, a existência corpórea, as tramas inconscientes e os múltiplos sentidos de cada fala acabam por constituir um campo de vida e de trabalho, onde aspectos técnicos e éticos precisam se manter entrelaçados".

A minha intenção é indicar uma produção interessante que nos reporta a problemas cruciais da nossa prática cotidiana e, ao mesmo tempo, lança-nos a uma situação de risco, em que somos elegantemente convidados a perder, momentaneamente, a teoria que acreditamos sustentar. Nos faz lembrar que enquanto as técnicas podem variar, a ética é o que se mantém em toda meta do processo analítico.

Assim, a ética engendrando a técnica, e não somente enquanto necessidade moral de existência de alguma ética — não é uma introdução, já é um desenvolvimento clínico neste livro. Afinal, num país que emana a sensação de que tudo esta por se fazer ou, de outro modo, uma introdução que parece não terminar, promovendo obras que mais alertam para os problemas do que instrumentalizam soluções possíveis. Podemos arriscar a pensar que aí reside uma “subtração” a ser ultrapassada. Esta obra traz os problemas e tenta destrinchá-los na tradição das melhores cepas.

O livro nos recoloca a tarefa de permitir que o homem do milênio tenha na psicanálise uma morada, onde possa serenamente repousar sua alma angustiada e ter uma experiência do divã uma abrigo que o permita sentir, emocionar-se e pensar um momento reflexivo, não maníaco, sem o qual não se consegue nem existir.

O convite dos autores é instigante, arriscado e ninguém sai impunemente, o que é um bom começo para qualquer leitor. Todos, agora, devidamente avisados.

Projective Identification: The Fate of a Concept

 

 

 

 

 

 

 

 Editor : Elizabeth Spillius, Editor : Edna O'Shaughness


Synopsis:

Elizabeth Spillius and Edna O'Shaughnessy explore the development of the concept of projective identification, which had important antecedents in the work of Freud and others, but was given a specific name and definition by Melanie Klein. They describe Klein's published and unpublished views on the topic, and then consider the way the concept has been variously described, evolved, accepted, rejected and modified by analysts of different schools of thought and in various locations — Britain, Western Europe, North America and Latin America.

The authors believe that this unusually widespread interest in a particular concept and its varied fate have occurred not only because of beliefs about its clinical usefulness in the psychoanalytic setting but also because projective identification is a universal aspect of human interaction and communication.

Projective Identification: 

The Fate of a Concept will appeal to any psychoanalyst or psychotherapist who uses the ideas of transference and counter-transference, as well as to academics wanting further insight into the evolution of this concept as it moves between different cultures and countries.

Description:

Contents Spillius, O'Shaughnessy, Foreword. Part I: Melanie Klein's Work. Spillius, The Emergence of Klein's Idea of Projective Identification in her Published and Unpublished Work. Klein, Notes on Some Schizoid Mechanisms. Part II: Some British Kleinian Developments. Spillius, Developments by British Kleinian Analysts. Bion, Attacks on Linking. Rosenfeld, Contribution to the Psychopathology of Psychotic States: The Importance of Projective Identification in the Ego Structure and the Object Relations of the Psychotic Patient. Joseph, Projective Identification: Some Clinical Aspects. Feldman, Projective Identification: The Analyst's Involvement. Sodré Who's Who? Notes on Pathological Identifications. Part III: The Plural Psychoanalytic Scene. Spillius, O'Shaughnessy, Introduction. 1. The British Psychoanalytic Society. O'Shaughnessy, The views of Contemporary Freudians and Independents about the Concept of Projective Identification. Sandler, The Concept of Projective Identification. 2. Continental Europe. Spillius, Introduction. Hinz, Projective Identification: The Fate of the Concept in Germany. Canestri, Projective Identification: The Fate of the Concept in Italy and Spain. Quinodoz, Projective Identification in Contemporary French-Language Psychoanalysis. 3. The United States. Spillius, Introduction. Schafer, Projective Identification in the USA: An overview. Spillius, A Brief Review of Projective Identification in American Psychoanalytic Literature. Malin, Grotstein, Projective Identification in the Therapeutic Process. Ogden, On Projective Identification. Mason, Vicissitudes of Projective Identification. 4. Latin America. Meyer, Introduction. Jarast, Projective Identification: Projections in Argentina. Massi, Projective Identification: Brazilian Variations of the Concept. Jordan-Moore, Projective identification and the Weight of Intersubjectivity. Spillius, O'Shaughnessy, Afterword.
 
Notes about the author(s): Elizabeth Bott Spillius, whose original background was in anthropology, is a training analyst at the British Institute of Psychoanalysis and a Distinguished Fellow of the British Psychoanalytical Society.

Edna O'Shaughnessy came to psychoanalysis from philosophy, first training as a Child Psychotherapist at the Tavistock Clinic in the 1950s. In the 1960s she trained at the British Psychoanalytical Society of which she is a training and supervising analyst and also a child analyst. Her many published papers are written from both a clinical and a conceptual perspective.

Formação ou deformação?!











A formação é um tema em repetição. É preciso repetir, repetir para chegar a elaborar. Com isso o tema formação está sempre em crise, porque a cada candidato vê-se o processo recomeçar; e para o candidato no seu percurso singular, ela acontecerá até que esse alcance uma identidade de psicanalista. Esta é a crise permanente da formação da identidade que o candidato vive internamente. No entanto, podemos observar que existe desde muito tempo, a crise permanente na formação, ou seja, a crise da formação institucional. E nesse sentido, gostaria de salientar, que em relação a identidade de psicanalista, pouco podemos falar e muito menos resolver, pois é um tema sempre em aberto, num eterno recomeçar; é um trabalho pessoal, de cada um dos candidatos desejantes a analistas.

Mas a crise na formação institucional, essa sim, deve ser pensada e discutida para que todos nós possamos contribuir para a melhoria das condições da formação, pois, para esta existem soluções possíveis, e que atendam a maioria dos candidatos.

A formação de identidade de analista, como dizem alguns, é da ordem do inefável, quer dizer, não basta a autorização da instituição, mas sim, o reconhecimento que o próprio analista faz de si mesmo. Sem dúvida, esta é uma parte fundamental no percurso de busca de identidade de analista, no entanto, a formação não se esgota no campo individual e interno da identidade, ao contrário, ela se estende ao institucional e social.

A formação institucional, é da ordem do real, existem exigências concretas para se obter a autorização de analista, sendo supostamente essas exigências que deveriam garantir a qualidade da formação, a respeitabilidade, e o reconhecimento social necessário ao movimento psicanalítico e a ciência psicanalítica.

Portanto, esse tema implica em pelo menos dois níveis de discussão, o da ordem da identidade de analista (o inefável) e da instituição formadora (o real), e o inevitável entrelaçamento destes. Mas julgo importante refletirmos sobre o perigo de se considerar a formação como exclusivamente da ordem do inefável, impedindo com isto, qualquer possibilidade de discussão e mudança, entrecobrindo com esse argumento a questão do poder.

A política aparece nas instituições psicanalíticas porque as relações hierárquicas e de poder estão sempre presentes, ou seja, mesmo tratando-se de candidatos, ou analistas, estamos fazendo política — defendendo interesses econômicos, sociais, ideológicos, científicos e etc. — tanto em nossa sociedade, como no movimento psicanalítico internacional. Afinal, somos filiados a IPA, e isso tem o seu significado, como também consequências.
O tripé no país da psicanálise
Todos parecem concordar com o fato da formação estar ancorada no tripé substantivo: análise, supervisão e teoria. Analisar, supervisionar e teorizar tem sido o tripé verbal do psicanalista em formação, assim adjetivado. E o psicanalista em formação, qual seria a sua conjugação? Ser analisado, supervisionado e ser teorizado?

A nós, cabe um duplo tripé. O primeiro, e talvez o mais perigoso para a identidade do futuro analista está na análise, supervisão e ensino. É nesse tripé que o “psicanalista” irá descobrir a própria forma ou arranjar a forma. Numa análise onde nem sempre o sintoma — o desejo de ser analista é compreendido. Nas supervisões onde a escuta não é analítica, mas de regras e fórmulas de atendimento; e no ensino onde a “verdade” transmitida é “ideologizada”, é para repetir e não recriar, é se por na “forma verdadeira” ao invés de descobrir psicanaliticamente a forma singular de vir-a-ser.

O segundo tripé é: atender, estudar e escrever. Esse só pode acontecer nas instituições onde a transmissão da psicanálise não é uma missa, ao contrário uma tarefa que também não é religiosa, mas provocadora e desruptora.

No “país da psicanálise”, a religião oficial é a não religião, a moral é a ética, o saber é o “não saber”, o governo é a não direção do desejo do outro, a instituição é o território da livre associação. Com isso quero dizer que a instituição de formação talvez não possa tomar para si o papel de formar um analista, mas, de criar condições para que ele faça o seu próprio percurso dentro desse tripé, ou seja, que o “psicanalista” possa desejar o como da sua formação e não ser “desejado” pela instituição. Enfim, o que fazer para não obstaculizar o processo psicanalítico que ocorre na análise pessoal do psicanalista em formação?

No meu entender, a instituição formadora já faz muito quando não atrapalha o processo psicanalítico com suas questões internas permitindo que a transferência seja realmente com o analista e não tornando-o um mero mediador da transferência do analisando com a instituição. Portanto, quando a instituição não dirige o desejo do formando e quando se despoja da carga fantasmática — de reconhecer e autorizar — que lhe é atribuída, já está cumprindo grande parte de sua função, ser continente de pessoas que desejam, e se angustiam com o sintoma — tornar-se psicanalista.
É necessário haver acolhimento
Contudo, mesmo não atrapalhando, resta a questão: como promover condições para a formação?

As sociedades de psicanálise, contribuem quando transformam a questão da autorização em pertinência e produção. A autorização tem sido o lastro de poder nessas instituições, que na realidade funcionam como associações, assumindo o papel social de constituir e preservar a “categoria” (valorizam a profissão aumentado o mercado de pacientes e o preço das sessões ...) deixando de lado sua função de acolher e propiciar o desenvolvimento daqueles que a procuram.

Não é por acaso que o segundo tripé não é considerado primordial, pois ele não regula as relações sociais de trabalho, ao contrário do primeiro que praticamente as define. Nesse caso, não faço distinção entre a ideia de análise didática ou a noção lacaniana de “passe”, pois ambos, de modo organizativo-ideológico diferente, a função permanece inalterada, ou seja, a da permissão, da licença ou do visto de entrada para o “país da psicanálise”.

Como lidar com essa situação real de que o analista didata é necessariamente a representação concreta e de poder dentro dos limites da análise? É possível existir uma boa transferência numa relação analítica tão perversamente poderosa? No meu entender há um equívoco fundamental na ideia da análise didática, pois uma análise é sempre pessoal. A função didática na formação deve estar voltada para os seminários, como bem lembra Grimberg, “constata-se que persiste um ”status quo” que existia nos primórdios do funcionamento dos Institutos Psicanalíticos, em que os analistas didatas eram mais clínicos do que educadores. Ocupavam-se mais do paciente do que do estudante. Aí existe uma contradição porque o estudante é o vínculo para o paciente, e a prática, como já vimos, não é e não pode ser considerada uma entidade isolada. Percebe-se, então, que a teoria passa a ser vista quase como uma espécie de algo maléfico. E essa afirmação também é uma teoria.”
Teoria x Experiência
O que observamos é o completo abandono dos seminários, que ficam relegados em relação às análises didáticas, e com isso a pobreza da formação fica evidente na baixa produção teórica de nossas sociedades. O fato da função didática estar posta na análise revela a desvalorização do Ensino da Teoria, esquecendo-se de que a psicanálise nasceu também da teorização.

François Roustang nos alerta de que “se a psicanálise renunciasse a ser uma ciência transmissível independente de quem a fundou ou daqueles que a refutam com suas teorizações, ela cairia fatalmente no ocultismo ou na magia... Essa prática soçobraria no indizível e no inefável e assim em todas as manipulações obscurantistas sem o índex de um aparelho teórico. Todo o efeito terapêutico seria deixado ao poder pessoal aos dons do analista e não ultrapassaria então o nível dos curandeiros e da feitiçaria, poderes e dons transmitidos de indivíduo a indivíduo por algumas comunicações de um segredo devendo ser mantido como segredo.”

A psicanálise derruba a crença quando propõe ao analisando fazer todo o esforço para não mais crer, e sim observar, experienciar e teorizar.

A possibilidade do novo, do criativo na psicanálise está na experiência e no discurso diferente de cada analista. E isso não quer dizer, que necessariamente teremos cisões e divisões em profusão. Ao contrário, pode significar um saber não narcísico, onde o reconhecimento não é da ordem do clã, da família ou da filiação daqueles que se percebem porque são iguais, mas sim, do possível interlocutor, daquele que escuta e também responde.

Não posso pretender dar conta de todos os problemas que existem na formação institucional, ao contrário, a proposta é de enfatizar a importância da continuidade da discussão entre candidatos e analistas, e que a diversidade sirva para enriquecer as possibilidades de mudança na formação.

Nada mais letal ao desenvolvimento psicanalítico do que o reconhecimento pela semelhança, ou o irreconhecimento pela diferença. Isso seria a morte psicanalítica da psicanálise.


Marina Massi

terça-feira, 27 de agosto de 2013

O Sentimento de Interioridade como Qualidade do Ser Mulher













Nos últimos anos, as mulheres vêm investigando e escrevendo muito sobre psicologia e a condição feminina, um fenômeno surpreendente frente aos parâmetros de um passado, não tão remoto, de escassas possibilidades para as mulheres refletirem sobre si mesmas. É necessário ressalvar, que a psicanálise, enquanto disciplina manteve-se aberta as mulheres, tendo nelas muito de sua produção atual.

Entretanto, a própria psicanálise tem, recentemente, enfrentado a pressão de uma nova realidade social, na qual, como diagnostica Wallerstein, evidencia "problemas como aqueles criados pelos movimentos feministas e o profundo impacto deles sobre nossa compreensão da psicologia normal e de psicopatologia das mulheres, por exemplo, a respeito das nossas noções familiares de passivo e ativo, ou masoquismo normal, e dos tão falados atributos de comportamento masculino e feminino; e novamente, aquelas questões relativas à nossa compreensão de comportamentos sexuais e patologia sexual trazidas à baila pela mudança de posição social e legal de indivíduos convencionalmente designados de homossexuais ou com desvios sexuais." (1)

É interessante notar que este diagnostico foi feito, em 1985, por um psicanalista que foi presidente da IPA. Portanto, podemos avaliar que já naquela época existia uma necessidade das instituições psicanalíticas responderem as questões emergentes de uma nova ordem ética de comportamentos humanos.

É nesse contexto — de produção, pesquisa, e transformação social — que surge em 1989, A Mulher sem Qualidades de Annie Anzieu; psicanalista da Associação Psicanalítica Francesa, tendo dirigido o departamento de psicanálise, no serviço de psiquiatria à criança do Hospital Salpêtrière.

Não é uma psicanalista especialmente conhecida no Brasil, mas certamente, através do lançamento de sua principal obra pela editora Casa do Psicólogo, Annie Anzieu não deixará de ocupar um lugar nos estudos de todos aqueles que se preocupam com tal temática.

As analistas mulheres parecem concordar que apesar dos preconceitos do pensamento Freudiano no que se refere ao universo feminino, ainda assim, o aporte psicanalítico deixado por Freud auxilia na concepção do feminino, ainda que, suas teorias psicanalíticas sejam empreguinadas de um sexismo. Sua obra, diz, Juliet Mitchell, "como baluarte da opressão ideológica das mulheres é, sem dúvida alguma, de grande importância. Mas só podemos entender seu significado, se compreendermos primeiro que eram exatamente as formações psicológicas produzidas dentro das sociedades patriarcais que ele estava revelando e analisando." (2)

O ensaio de 1925, trata pela primeira vez a diferente história psicossexual de meninos e meninas, ele estabelece um desenvolvimento distinto para meninas e meninos, considerando essa formação dentro de uma cultura de domínio masculino. Neste momento, Freud reconhece a importância da fase pré-edipiana, principalmente para as meninas. Do meu ponto de vista, esta é a grande contribuição que Freud nos lega para a investigação das diferenças de gênero, possibilitando que, de fato ocorra a aproximação das questões relativas ao ser mulher e ao ser homem.

Mas, voltemos ao livro, e retomemos o pensamento de Anzieu, já que algumas considerações foram lançadas.

A primeira parte do livro é uma reflexão sobre o ser mulher depois de Freud, na qual encontramos o capítulo "Negativo e Feminino: A Mulher sem Qualidade" que inspira o próprio título, e não como imediatamente nos ocorre, uma referência à obra de Robert Musil, "O Homem sem Qualidades". Anzieu opõe-se a idéia da mulher no negativo, do feminino como o não masculino, ou da mulher como o negativo da mãe. "Os homens pensam a mulher, e acham simples retirar-lhe um pênis. E depois, essa perspectiva evoca possibilidades inquietantes: a contragosto eles se defendem por uma construção teórica — reivindicação, castração, falta. Como se ser mulher fosse um defeito, uma doença, uma tendência ao não-ser" (p.3).

A autora propõe que pensemos a mulher naquilo que expressa o mais fundamental do ser feminino — o sentimento de interioridade. Para Anzieu o modelo da interioridade feminina pode oferecer respostas a questões colocadas pela essência da feminilidade. No entanto, não pretende contrapor o modelo de interioridade ao de falicidade, "mas modificar a representação de suas relações pelo reconhecimento de uma especificidade do feminino, que na realidade é apenas uma categoria de pensamento derivada da existência da mulher. Essa é uma questão importante já que essas diferenciações estruturam o aparelho psíquico desde a mais tenra idade." (p.5)

Uma das questões que julgo crucial é se o uso desses "modelos anatômicos" para explicar as diferenças entre homens e mulheres, não empurra a psicanálise excessivamente para o terreno do biológico, e de certo aquém de Freud, delineando uma vida psíquica agarrada a anatomia do corpo, mesmo tratando-se do corpo erógeno, quando deixa de investigar as produções de fantasia e formas de pensamento, passando a verificar as sensações advindas do corpóreo.

Ao invés de configurar a diferença no campo das representações e experiências psíquicas entrelaçadas ao corpo, é como se o aparelho psíquico fosse construído por uma gama de experiência de sentimentos do corpo, o que pode equivaler a uma transposição de representações anatômicas imaginárias para o aparelho psíquico. De certo modo, uma declaração de morte ao conceito freudiano de pulsão ou mesmo de representação psíquica em Klein onde a experiência emocional é prevalente sobre o próprio corpo ou determinações anatômicas, aí reside toda a complexidade da qual a psicanálise investiga na vida psíquica dos seres humanos — aquilo que é pode simultaneamente não ser. Uma mulher de corpo, com sensações de corpo feminino pode, contudo, em fantasia pensar-se como um homem.

Como nos afirma Emilce Dio Bleichmar, "esta passagem do corpo ao simbólico na determinação da identidade, até hoje chamada identidade sexual — justamente pelo peso atribuído à marcação anatômica — e que de agora em diante deveríamos denominar identidade de gênero, contribui para reintroduzir na teorização psicanalítica uma orientação que os próprios trabalhos de Freud sobre a feminilidade interromperam: a importância da realidade psíquica, do registro da fantasia, da crença, do simbólico..." (3). A questão, portanto, é como alcançar o que seria o mais fundamental e característico do ser mulher sem reduzí-la a certas qualidades que podem contribuir mais para uma adjetivação das diferenças do que o entendimento das mesmas. Como podemos ver, o problema é, no fundo, metapsicológico, e depende dos pressupostos que adotarmos.

A relação da escrita e o feminino constituem a segunda parte, na qual é desenvolvida a noção de que a escrita feminina substitui a gestação ou lhe dá continuidade, o texto seria, então, o resultado de uma sublimação da relação com um ser amado.

Alguns de seus comentários divergem frontalmente da visão de pensadoras e pesquisadoras feministas sobre o que tem levado as mulheres a escreverem e produzirem tanto nos últimos anos. Acredita-se que com a descoberta dos anticoncepcionais e com a distinção concreta entre mulher e mãe (maternidade), tornou-se possível a expressão de outros aspectos criativos e participativos da mulher na sociedade, que até então confundiam-se com a questão da reprodução.

Mas esta não é a avaliação de Anzieu, que julga estarmos numa época na qual os homens tem concedido as mulheres o direito de serem estéreis, e que escrever como mulher seria um protesto, diz ela, pela "imposição de uma casualidade linear do falo à criação... a reivindicação atual das mulheres de escrever como mulheres é o resultado de um narcisismo feminino mal estabelecido nos seus fundamentos somáticos, em muitos casos, sem dúvida, por identificação com algumas lacunas narcísicas maternas: um erro no conhecimento dos privilégios da feminilidade." (p.82)

Por fim, na terceira parte, ela analisa as "qualidades" da mulher analista e a função do feminino na transferência utilizando-se dos conceitos já desenvolvidos nos capítulos anteriores, tais como cavidade, germinação, retenção, penetrabilidade, etc.

A mulher, para Anzieu, é um ser essencialmente penetrável, um continente que contém a vida e as suas marcas de transformação, gestação silenciosa e paciente do novo, lugar de passagem e nascimentos. Assim, a mulher "coloca à disposição do analisando o espaço psíquico natural de que ela é construída, espontaneamente envolvente, `instintual' no sentido freudiano.", o sentimento de interioridade, a essência especificamente feminina. Esse estado pode existir nos homens analistas, mas para tanto, é necessário de acordo com a autora, que ocorra o alargamento das capacidades identificadoras colocando-o em contato com as partes femininas da sua sexualidade.

Para o leitor exigente, contudo, é preciso sobreavisá-lo de que nem tudo é aceitável tranquilamente, muito pelo contrário, o livro merece ser lido pelo vértice dos problemas que ele deflagra, ora por querer, ora sem perceber.

Afora as advertências teóricas, há também outra particularidade que merece ser destacada, qual seja, a escrita de Anzieu. O seu estilo de escrever simula, em alguns momentos, uma "poética psicanalítica" com a intenção de desvelar literariamente o mundo do feminino. Assim, ela acaba por produzir momentos de aguda sensibilidade conseguindo descrever fenomenológicamente experiências emocionais e sensoriais, juntamente com trechos de imprecisão, que confundem o desenvolvimento teórico dos conceitos — uma recriação poética dos fenômenos internos, para daí extrair algum conhecimento.

Como o leitor pode notar, o livro possui a qualidade de enfrentar o "enigma da mulher", não evitando adentrar nos "buracos negros" da psicanálise, tais como a origem do mundo mental e a constituição das diferenças sexuais e psíquicas entre os humanos. Por tudo isso, vale a pena conferir o percurso corajoso e original de Anzieu.

Sobre Freud e suas mulheres : associação livre [ mente & cérebro ]


Sobre Freud e suas mulheres, obra recém-lançada, As mulheres de Freud propõe uma viagem histórica pelo universo feminino; o criador da psicanálise e sua teoria são apresentados sob novos ângulos. A romancista e escritora Lisa Appignanese e o professor de história e filosofia da ciência da Universidade de Cambridge John Forrester, acadêmico que já publicou várias obras psicanalíticas, uniram-se para investigar e narrar a trajetória das mulheres que participaram da vida de Freud. Em uma obra de fôlego, a dupla revela o impacto feminino no desenvolvimento das ideias relativas à feminilidade e ao legado dessa produção intelectual para a cultura contemporânea. Em virtude das diferentes áreas de especialização, pareceu aos autores que seria lógico dividir o material de modo que Forrester tratasse das personagens que foram “descobertas” pelo olhar de Freud:  parentes, figuras de sonhos, pacientes e suas ideias sobre feminilidade. Já Appignanese trataria das primeiras analistas, tradutoras e escritoras próximas ao pensador.

Os escritores reconhecem que o desafio era potencialmente infinito, uma vez que tantas mulheres tiveram importância na história da psicanálise e o debate sobre feminilidade nessa área vem se desenrolando até hoje. Decidimos limitar nossa narrativa às personagens que tiveram contato direto e continuado com Freud. Em consequência disso, não tratamos particularmente de Karen Horney ou Melanie Klein, para citar apenas duas, embora elas figurem nas páginas do livro. Infelizmente, a decisão de não incluir uma pensadora do porte de Klein, por exemplo, traz problemas estruturais, que implicam a sensível perda do entendimento de toda uma vertente do debate sobre a mulher. É inegável, porém, que As mulheres de Freud tem muitos pontos positivos. Entre eles, está o fato de que ajuda o leitor a rever as acusações de que o criador da psicanálise teria sido um misógino, um patriarca conservador que via como principal função das mulheres servir à reprodução da espécie. Os autores creem que uma das questões esclarecidas por essa pesquisa foi que a concentração excessiva nos fracassos de Freud era, em si, uma maneira de negar às mulheres que figuram na história da psicanálise seu lugar de direito. Uma vez restituído este lugar, tanto Freud quanto a psicanálise adquiriram um aspecto sutilmente diverso. E essa talvez seja uma das mais importantes conclusões desse imenso trabalho de pesquisa histórica, que instiga tantas discussões teóricas. A pesquisa reúne dados anteriormente esparsos e revela de modo histórico-científico que muitas outras além de Salomé e da princesa



Bonaparte eram amigas e analistas ativas. Entre elas estão Ruth Marck Brunswick, Muriel Gardiner, Eva Rosenfeld, Jeanne Lampl Groot, Hilda Doolittle e mais todo o círculo de analistas da filha Anna Freud. No início do livro são apresentadas as mulheres-chave da família de Freud: a mãe, a noiva que virou esposa e as filhas. A segunda parte trata da colaboração das pacientes histéricas no desenvolvimento da prática e teorias freudianas. Na etapa seguinte são focalizadas as mulheres que se tornaram as primeiras analistas do círculo de Freud, como Sabina Spieelrein, Lou Andreas-Salomé, Helene Deutch, Marie Bonaparte e Joan Riviere. Num livro de 16 capítulos extensos, com rigoroso levantamento bibliográfico, que revela um sério trabalho de pesquisa, alguns trechos históricos são especialmente significativos e curiosos. É o caso de “Primeiras amigas, primeiros casos, primeiras seguidoras” (cap. 6), no qual o leitor fica sabendo, por exemplo, que o divã foi presente de uma paciente agradecida, por volta de 1900. No capítulo 13, A amizade das mulheres”, é surpreendente constatar o quanto as mulheres se desenvolveram dentro da psicanálise “o que nos convida a rever a ideia do círculo de amigos formado apenas por homens (como Carl Jung, Wilhelm Fliess, Alfred Adler, Karl Abraham) ao redor de uma mesa para discussão psicanalítica, às quartas-feiras.

O capítulo 15, “O debate sobre a mulher, com abordagem mais teórica, evoca as figuras de Helene Deutch, Karen Horney e Melanie Klein para tratar da constituição do feminino. Os autores apontam a importância de uma discussão correlata acerca do peso atribuído aos fatores traumáticos (ambientais) ou constitutivos e de disposição (hereditários), temas atuais não somente para a feminilidade, mas também para todos os aspectos de constituição psíquica do sujeito. Para Freud, o campo da psicanálise é o acidental, o traumático por natureza. Segundo ele, o que fica de fora, o que permanece inexplicável, o que é temporariamente atribuído à constituição, não é o mais importante, o mais fundamental, mas sim o ponto no qual as explicações fracassam, o ponto em que a ciência emudece. Por fim, somos surpreendidos pelo último capítulo, “Feminismo e psicanálise”, no qual feministas ultrapassam a hostilidade visceral em relação a Freud, o que torna possível evidenciar uma relação mais complexa que abarque novos desdobramentos. Uma vez que as feministas perceberam a revolução sexual do século XX como uma força positiva e libertadora, a associação de Freud com esse movimento garantiu-lhe um lugar de respeito entre os antecessores dos movimentos progressistas contemporâneos.

Marina Massi é psicanalista, membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), doutora pela Universidade de São Paulo (USP) e autora do livro Vida de mulheres: cotidiano e imaginário, Imago, 1992.